Descriminalização do aborto: tema divide opiniões em Sergipe

Em entrevista exclusiva, Emília Côrrea e Sonia Meire explanam sobre assunto em destaque no STF.


Última atualização em 28/09/2023 por Ítalo Duarte

Por Fernanda Santiago, SE79

A possível descriminalização do aborto se tornou pauta nesta semana, levantando discussões acerca do tema, inclusive em Sergipe. A ação começou a ser julgada na última sexta-feira, 22, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), e tenta descriminalizar a interrupção voluntária da gravidez feita por mulheres com até 12 semanas de gestação. Relatora da ação, a ministra Rosa Weber foi a primeira a votar e defendeu a descriminalização do aborto.


No momento, a votação está suspensa por pedido do ministro Luís Roberto Barroso e será realizada em sessão presencial, sem data definida para acontecer. Ainda assim, o tema vem ganhando repercussão nas mais distintas esferas. Na Câmara de Vereadores de Aracaju, por exemplo, é possível encontrar posicionamentos distintos acerca da descriminalização. 

Para a vereadora Emília Corrêa (Patriota), o Brasil não está preparado para a descriminalização do aborto – confira a íntegra da entrevista em vídeo no fim da matéria.

“Eu entendo que o Estado maior, seja federal, estadual ou municipal, não está cumprindo com o seu dever em relação às mulheres. Eles não estão cuidando da saúde da mulher, não estão conscientizando e querem começar pelo fim, que é atingir o direito de outra vida.”

Em entrevista a este portal.

Em sua opinião, a vida tem que ser preservada e a saúde da mulher tem que ser cuidada.

“No momento em que ela se encontra naquela gravidez indesejada, a rede tem que surgir, para dar suporte àquela mulher e resguardar a vida do bebê”, reitera Emília, que acredita que uma rede funcionando da forma adequada poderia atender a mulher e ampará-la, evitando um possível aborto. 

Já a vereadora Sonia Meire (PSOL) considera ser muito importante tratar sobre a descriminalização. Para ela, “aborto é uma questão de saúde pública e de educação, não é uma questão para ser tratada como crime, como foi colocado na década de 40″.

“As mulheres vítimas de violência e as mulheres que acabam tendo uma gravidez indesejada não podem, ao retirar este feto, serem tratadas como criminosas.”

Em entrevista exclusiva ao SE79, que você confere a íntegra em vídeo abaixo da matéria.

A vereadora expõe ainda que mulheres que precisam ser hospitalizadas por conta do procedimento são maltratadas. Segundo ela, algumas não recebem atendimento adequado e outras não recebem as medicações capazes de evitar maiores sofrimentos.

“Nós estamos na luta para descriminalizar o aborto, para que as mulheres possam ser tratadas na saúde com respeito, que façam o aborto em situação humanizada, que tenha atendimento psicológico. Muitas vezes elas precisam até de atendimento psiquiátrico. É isso que nós defendemos, nem presas, nem mortas, nós queremos nossas mulheres, nossas crianças e nossos adolescentes protegidos.”

Vereadora Sonia Meire.

Panorama brasileiro

Atualmente, no Brasil, o aborto só é permitido até a 12ª semana quando a gravidez é decorrente de estupro, quando há risco de morte materna e em casos de anencefalia fetal. Porém, na prática, apesar de crime, o cenário tem sido diferente. A Pesquisa Nacional de Aborto (PNA) de 2021 aponta que, no Brasil, uma em cada sete mulheres, com idade próxima aos 40 anos, já fizeram um aborto. Destas, 43% foram hospitalizadas.

Segundo estimativa do Ministério da Saúde, divulgada em 2018 e repercurtida pelo Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), 1 milhão de abortos acontecem todos os anos no Brasil. Os procedimentos inseguros levam à hospitalização de mais de 250 mil mulheres por ano, com estimativa de que haja uma morte a cada dois dias em decorrência de aborto inseguro. 

Diante de tais dados, a médica e doula Rayssa Didou frisa que decisões de saúde coletiva precisam estar ancoradas em evidências científicas e estas, segundo ela, “demonstram que a descriminalização teria o efeito crucial de redução da mortalidade materna”.

“Quanto maior a restrição legal à prática do aborto, maior a proporção de procedimentos clandestinos e inseguros, que é hoje a quinta maior causa de morte de gestantes no país”, relata.

Didou reforça que o abortamento é considerado a intercorrência obstétrica mais comum, no qual o corpo da mulher se recupera espontaneamente.

No caso de abortos provocados, porém, a médica aponta que podem ocorrer algumas complicações imediatas, entre elas “o aborto incompleto e infecção, que são malefícios mais prováveis de acontecer quando o procedimento não é realizado com assistência. A maneira mais eficaz de reduzir essas complicações é seguir protocolos médicos que delineiam procedimentos seguros”.

A médica aponta ainda que, segundo as evidência, o aborto bem assistido não está associado a riscos subsequentes de aumento de gravidez ectópica, infertilidade, placenta prévia ou mesmo de outros abortos espontâneos.

A professora e doutora em Ciências Humanas Patrícia Rosalba expõe que o aborto está presente em todas as classes sociais, mas que atinge, em termos de criminalização e mortes, um grupo específico de mulheres: as pobres e negras.

“Não podemos esquecer que o debate sobre aborto está situado no âmbito dos direitos reprodutivos e dos direitos humanos. A interrupção da gravidez deve ser pensada considerando as questões de saúde pública. Não é uma questão de polícia, mas de saúde e de direito. É preciso considerar os dados das pesquisas científicas, os índices sobre aborto e entender o porquê que mulheres estão morrendo”, pontua Rosalba.

O que mudaria com a descriminalização?

Hoje, o crime de aborto está descrito no Código Penal, de 1940, entre os artigos 124 e 128, e prevê que a mãe e os envolvidos no procedimento sejam processados e punidos, com penas que variam de 1 a 10 anos de reclusão, a depender do caso. 

A ação que está sendo julgada pelo STF define que as mulheres e os profissionais envolvidos no procedimento não sejam punidos pelo crime de aborto. Entretanto, isso não significa que o procedimento vá passar a ser oferecido no Sistema Único de Saúde (SUS), ou incluído na legislação. Para tanto seria necessária a aprovação do tema no Congresso e resoluções do Poder Executivo. 

Confira as entrevistas das vereadoras na íntegra


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